"Tão importante quanto o que se ensina e se aprende é como se ensina e como se aprende". (César Coll)

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sábado, 26 de setembro de 2009

Trabalho com nomes Próprios

Trabalho pedagógico com nomes próprios

Rosa Maria Antunes de Barros*

O conhecimento do próprio nome tem duas conseqüências importantes para os alunos que
estão se alfabetizando:
• é uma escrita livre de contexto;
• é uma escrita que informa sobre a ordem não-aleatória dentro do conjunto de letras.
A escrita do próprio nome representa uma oportunidade privilegiada de reflexão sobre o
funcionamento do sistema de escrita, pelas seguintes razões:
• tanto do ponto de vista lingüístico como do gráfico, o nome próprio é um modelo estável;
• o nome próprio é um nome que se refere a um único objeto, com o que se elimina,
para a criança, a ambigüidade na interpretação;
• o nome próprio tem valor de verdade porque se reporta a uma existência, a um saber
compartilhado por ambos, emissor e receptor;
• do ponto de vista da função, fica claro que identificar objetos ou indivíduos com nomes
faz parte dos intercâmbios sociais da nossa cultura;
• do ponto de vista da estrutura daquilo que está escrito, a pauta lingüística e o referente coincidem.
A escrita de nomes próprios é uma boa situação para trabalhar com modelos de escrita, e isso
é conveniente porque esse tipo de modelo oferece informação à criança sobre:
• a forma e o valor sonoro convencional das letras;
• a quantidade de letras necessária para escrever os nomes;
• a variedade, a posição e a ordem das letras em uma escrita convencional;
• a realidade convencional da escrita, o que serve de referência para checar as próprias hipóteses.
Algumas atividades
No que se refere ao trabalho pedagógico, têm se mostrado produtivas as situações
em que as crianças precisem:
• Consultar listas de nomes ou apelidos.
• Reconhecer a escrita dos nomes dos colegas.• Identificar diferentes segmentos constituintes dos nomes (sílabas, fonemas/letras),
fazendo uso desse conhecimento em outras situações.
• Identificar, em fichas ou cartões, o próprio nome, o dos colegas ou outros.
• Usar/ver a utilização de nomes para marcar desenhos, objetos, utensílios, roupas,
trabalhos de classe.
• Copiar nomes em situações em que isso é necessário e/ou faz sentido.
• Montar um nome com letras fornecidas pela professora, em número exato e sem
modelo.
• Escrever nomes com letras móveis, sem modelo, selecionando-as dentre um conjunto
de letras.
• Escrever o nome do colega nos trabalhos feitos por ele.
• Organizar agenda telefônica, estabelecendo correspondência entre os nomes e os
respectivos números de telefone.
• Participar de jogos dos seguintes tipos:
• “forca” com nomes;
• jogo da memória (relacionando fotos e nomes);
• bingo de nomes;
• adivinhações, como por exemplo: “Tenho um cartão com um nome de seis letras,
que começa com a primeira letra do nome do Fábio. Qual é?”.
• Participar de outras situações desafiadoras, tais como:
• A professora coloca na mesa as letras dos nomes de quatro alunos: cada um
deve encontrar as que pertencem ao seu próprio nome e, depois, com o grupo,
procurar quais são coincidentes com as dos outros nomes.
• Descoberta dos nomes que vão sendo escritos na lousa pela professora, a partir
das orientações que ela oferece: “Primeiro o S, depois o A… De quem será este
nome?” (entre outras possibilidades).
• Utilização de cartões com o nome dos personagens das histórias lidas, misturados
a outros com os nomes das crianças, para classificar e analisar, por exemplo:
- quais são os nomes que começam como o de Branca de Neve;
- quais os que têm mais letras que o nome do Pinóquio;
- quais são escritos como o de Chapeuzinho Vermelho

Atividades de alfabetização (Bichos de jardim)

















Texto para Estudo

AS CONCEPÇÕES DAS CRIANÇAS A RESPEITO DO SISTEMA DE ESCRITA


FERREIRO, Emília. Reflexões sobre a alfabetização. São Paulo : Cortez, 1990.

Os indicadores mais claros das explorações que as crianças realizam para compreender a natureza da escrita são suas produções espon­tâneas, entendendo como tal as que não são o resultado de uma cópia (imediata ou posterior)) Quando uma criança escreve tal como acredita que poderia ou deveria escrever certo conjunto de palavras está nos oferecendo um valiosíssimo documento que necessita ser interpretado para poder ser avaliado. Essas escritas infantis tem sido consideradas displicentemente como garatujas ”puro jogo” o resultado de fazer “como se” soubesse escrever Aprender a lê-­las - isto é, a interpreta-las — e um longo aprendizado que requer uma atitude teórica de­finida. Se pensarmos que a criança aprende só quando e submetida a um ensino sistemático, e que a sua ignorância esta garantida ate que receba tal tipo de ensino, nada poderemos en­xergar. Mas se pensarmos que as crianças são seres que ignoram que devem pedir permissão para começar a aprender, talvez comecemos a aceitar que podem saber, embora não tenha sido dada a elas a autorização institucional para tan­to. Saber algo a respeito de certo objeto não quer dizer, necessariamente, saber algo socialmente aceito como “conhecimento” “Saber” quer dizer ter construído alguma concepção que explica certo conjunto de fenómenos ou de objetos da realidade. Que esse “saber” coincida com o “saber” socialmente válido é um outro problema (embora seja esse, precisamente, o problema do “saber” escolarmente reconhecido). Uma criança pode conhecer o nome (ou o valor sonoro convencional) das letras, e não compreen­der exaustivamente o sistema de escrita. Inver­samente, outras crianças realizam avanços subs­tanciais no que diz respeito à compreensão do sistema, sem ter recebido informação sobre a denominação de letras particulares. Aqui mencionaremos brevemente alguns aspectos funda­mentais desta evolução psicogenética, que tem sido apresentada e discutida com maior deta­lhe em outras publicações. As primeiras escritas infantis aparecem, do ponto de vista gráfico, como linhas onduladas ou quebradas (ziguezague), continuas ou frag­mentadas, ou então como uma série de ele­mentos discretos repetidos (séries de linhas verticais, ou de bolinhas). A aparência gráfica não é garantia de escrita, a menos que se co­nheçam as condições de produção.
O modo tradicional de se considerar a es­crita infantil consiste em se prestar atenção apenas nos aspectos gráficos dessas produções, ignorando os aspectos construtivos. Os aspectos gráficos têm a ver com a qualidade do traço, a distribuição espacial das formas, a orientação predominante (da esquerda para a direita, de cima para baixo), a orientação dos caracteres individuais (inversões, rotações, etc.). Os aspec­tos construtivos têm a ver com o que se quis representar e os meios utilizados para criar diferenciações entre as representações. Do ponto de vista constru tivo, a escrita infantil segue uma linha de evolução surpreen­dentemente regular, através de diversos meios culturais, de diversas situações educativas e de diversas línguas. Ai, podem ser distinguidos três grandes períodos no interior dos quais ca­bem múltiplas subdivisões:
• distinção entre o modo de representação icônico e o não-icônico;
• a construção de formas de diferenciação (con­trole progressivo das variações sobre os eixos qualitativo e quantitativo):
• a fonetização da escrita (que se inicia com um período silábico e culmina no período alfabético).
No primeiro período se conseguem as duas distinções básicas que sustentarão as constru­ções subsequentes: a diferenciação entre as marcas gráficas figurativas e as não-figurativas, por um lado, e a constituição da escrita como objeto substituto, por outro.6 A distinção entre desenhar” e “escrever” é de fundamental im­portância (quaisquer que sejam os vocábulos com que se designam especificamente essas ações). Ao desenhar se está no domínio do icônico; as formas dos grafismos importam porque reproduzem a forma dos objetos. Ao es­crever se está fora do icônico: as formas dos grafismos não reproduzem a forma dos objetos, nem sua ordenação es pacial reproduz o contorno dos mesmos. Por isso, tanto a arbitrariedade das formas utilizadas como a ordenação linear das mesmas são as primeiras características manifestas da escrita pré-escolar. Arbitrariedade não significa necessariamente convencia­nalidade. No entanto, também as formas conven­cionais costumam fazer a sua aparição com mui­ta precocidade. As crianças não empregam seus esforços intelectuais para inventar letras novas: recebem a forma das letras da sociedade e as adotam tal e qual.
Por outro lado as crianças dedicam um grande esforço intelectual na construção de formas de diferenciação entre as escritas e é isso que caracteriza o período seguinte. Esses Critérios de diferenciação são, inicialmente, in­trafigurais e consistem no estabelecimento das propriedades que um texto escrito deve possuir para poder ser interpretáveis (ou seja, para que seja possível atribuir-lhe uma significação). Esses critérios intrafigurais se expressam, sobre o eixo quantitativo, como a quantidade mínima de letras — geralmente três — que uma escrita deve ter para que “diga algo” e, sobre o eixo qualitativo, como a variação interna necessária para que uma sé rie de grafias possa ser in­terpretada (se o escrito tem “o tempo todo a mesma letra”, não se pode ler, ou seja, não é interpretável).
O passo seguinte se caracteriza pela a busca de diferenciações entre as escritas produzidas, precisamente para “dizer coisas diferentes”. Co­meça então uma busca difícil e muito elaborada de modos de diferenciação, que resultam ser interfigurais; as condições de legibilidade intra­figurais se mantém, mas agora é necessário criar modos sistemáticos de diferenciação entre uma escrita e a seguinte, precisamente para garantir a diferença de interpretação que será atribuida. As crianças exploram então critérios que lhes permitem, às vezes, variações sobre o eixo quantitati vo (variar a quantidade de letras de uma escrita para outra, para obter escritas diferentes), e, ás vezes, sobre o eixo qualitativo (variar o repertório de letras que se utiliza de uma escrita para outra: variar a posição das mesmas letras sem modificar a quantidade). A coordenação dos dois modos de diferenciação (quantitativos e qualitativos) é tão difícil aqui como em qualquer Outro domínio da atividade Cognitiva.
Nestes dois primeiros períodos, o escrito não está regulado por diferenças ou semelhan­ças entre os significantes sonoros. Ë a atenção à propriedades sonoras do significante que marca o ingresso no terceiro grande período desta evolução. A criança começa por descobrir que as partes da escrita (suas letras) podem corresponder a outras tantas partes da palavra escrita (suas sílabas). Sobre o eixo quantitativo.
Isto se exprime na descoberta de que a quantidade de letras com que se vai escrever uma palavra pode ter correspondência com a quanti­dade de partes que se reconhece na emissão oral. Essas “partes’ da palavra são inicialmente as suas sílabas. Inicia-se assim o período silá­bico, que evolui até chegar a urna exigência rigorosa: uma sílaba por letra, sem omitir sílabas e sem repetir letras. Esta hipótese silábica é da maior importância, por duas razões: permite obter um critério geral para regular as variações na quantidade de letras que devem ser escritas, e centra a atenção da criança nas variações so­noras entre as palavras. No entanto, a hipótese silábica cria suas próprias condições de contra­dição: contradição entre o controle silábico e a quantidade mínima de letras que uma escrita deve possuir para ser “interpretáveis” (por exem­plo, o monossílabo deveria se escrever com uma única letra, mas se coloca uma letra só, o es­crito “não se pode ler”, ou seja. não é interpretáveis): além disso, contradição entre a interpretação silábica e as escritas produzidas pelos adultos (que sempre terão mais letras do que as que a hipótese silábica permite antecipar).
No mesmo período — embora não necessa­riamente ao mesmo tempo — as letras podem começar a adquirir valores sonoros (silábicos) relativamente estáveis, o que leva a se esta­belecer correspondência com o eixo qualitativo: as partes sonoras semelhantes entre as palavras começam a se exprimir por letras semelhantes. E isto também gera suas formas particulares de conflitos. Os conflitos antes mencionados (aos que se acrescenta às vezes a ação educativa, con­forme a idade que tenha a criança nesse mo­mento), vão desestabelizando progressivamente a hipótese silábic a, até que a criança tenha cora­gem suficiente para se comprometer em um novo processo de construção.
O período silábi­co-alfabético marca a transição entre os esquemas prévios em via de serem abandonados e os esquemas futuros em vias de serem construídos. Quando a criança descobre que a sílaba não pode ser considerada como uma unidade, mas que ela é, por sua vez, reanalizável em elementos meno­res, ingressa no último passo da compreensão do sistema socialmente estabelecido. E, a partir dai, descobre novos problemas: pelo lado quantita­tivo, que se por um lado não basta uma letra por sílaba, também não se pode estabelecer nenhuma regularidade duplicando a quantidade de letras por silaba (já que há sílabas que se escrevem com uma, duas, três ou mais letras]; pelo lado qualitativo, enfrentará os problemas ortográficos (a identidade de som não garante identidade de letras, nem a identidade de letras a de sons).